terça-feira, 1 de maio de 2018

Notívago

Dia desses, vi andando por aqui um gato de olhar confuso e nada efusivo. Um gato que se ajeita numas sombras diurnas e se esparrama na imensidão dessas noites pequenas. Que parece saber que a serenidade das tardes merece todo nosso apreço e que as manhãs também precisam ser vividas.

E tá por aqui ainda, o gato, aqui por dentro... Numa luta contra o tempo, o tempo dele, o tempo do qual ele acha que tem o mínimo de controle e entendimento. O tempo que às vezes o sufoca, e que às vezes o faz querer caminhar. Constante, claro, alguns arrastar de horas pelo dia, rolando sobre algumas coisas, dormindo em cima de outras muitas, tendo umas ideias frescas e outras vagabundas.

Em noites lindas e atípicas, por algum motivo, sob céu limpo ele se senta a conversar comigo e me sussurra as profundezas do peito. Diz já não querer se perder no tempo, que quer buscar equilíbrio entre instinto e racionalidade. Quer o intermédio entre ar e vento. Quer se encontrar de verdade. E também viver de luz e de caminhadas acesas pela manhã, farejar muitos ares, pra só então decidir qual deles vai ser seu combustível fiel até a morte.

E até algumas decisões sangrentas serem tomadas, até esses nós sem olhos serem desatados e umas promessas cumpridas, o lado incansavelmente recluso de seu ser se fará assiduamente presente. Calado. Afastado. Bate o rabo. Se vira.

E tá por aqui ainda, o gato. Aqui por dentro... 

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