terça-feira, 3 de março de 2015

Minhas mais sinceras retóricas

Parece haver um consenso social de opiniões sobre alguns eventos que ocorrem em nosso país. Não raro, ligamos nossas TV's e nos deparamos com casos de violência, homicídio, corrupção, dentre outras barbáries. E a reação geral em relação a tudo isso é o choque, o horror, a repulsa. É levar as mãos à cabeça e deixar escapar um "Meu deus do céu...".

Pra exemplificar, o caso mais fresco e que despertou comoção nacional foi o de Chauan Jambre Cezário, jovem negro de 19 anos, que foi baleado e teve seu amigo, Alan De Souza Lima, morto por policiais militares numa favela de Honório Gurgel, subúrbio do Rio. Não bastasse o ocorrido, os policiais implantaram falsas provas ao local do crime e alegaram tratar-se de um confronto com bandidos armados. Entretanto, para o imenso e muito bem-vindo azar dos verdadeiros bandidos da história, os dois jovens gravavam um vídeo, por diversão, no momento da ação policial. Vídeo esse que, mesmo com o celular caído no chão, continuou sendo gravado e serviu como prova da inocência de Chauan.

Esse caso é só mais um no meio de tantos outros que não recebem a devida visibilidade, tamanha é a frequência desse tipo de coisa. Assim como é frequente casos de homossexuais sendo agredidos e assassinados e mulheres sendo espancadas até a morte por seus maridos. Nada disso é novidade, nada disso é raro. E ainda assim nos choca, nos aterroriza.

Mas a pergunta que não quer calar é: isso basta? Ficarmos chocados com essas notícias e soltarmos meia dúzia de frases de horror vai fazer com que esses eventos deixem de acontecer com absurda frequência? Casos como o de Chauan merecem muito mais de nós do que uma testa franzida diante de um telejornal. O que estamos fazendo a respeito disso?

Quem é que está disposto a se policiar todo dia, o tempo todo, para não cometer atitudes, ainda que mínimas, racistas, homofóbicas e sexistas? Quem é que está disposto a ser o chato da galera e repreender o autor de piadinhas desses gêneros? Pra alguns, pode parecer uma enorme de uma bobagem fazer esse tipo de coisa, adotar esse tipo de comportamento. Entretanto, mais uma vez questiono: onde é que têm origem os crimes de ódio, senão nas pequenas atitudes preconceituosas do dia a dia?

Negros ainda morrem por serem negros, homossexuais morrem por serem homossexuais e mulheres por serem mulheres. Mas como as coisas não existem porque existem, como elas não têm início e fim num vácuo, há, por detrás de todo crime de ódio, um sistema social que funciona à base daquelas pequenas atitudes e piadinhas, à base de produtos midiáticos nocivos à igualdade de direitos e, dentre outras coisas, um governo altamente negligente em relação a essas causas, o que acaba por nos afirmar que elas realmente não são tão importantes assim.

O subconsciente social formado a partir de tudo isso pode ser assustador. Como crianças tendem a reproduzir os exemplos de seus pais, nós aprendemos e reproduzimos os mecanismos do meio social. Elucidando ainda mais a questão, é como se o conjunto de relações, comportamentos e ideias de designações racistas, homofóbicas e sexistas, ao qual estamos expostos o tempo inteiro, fosse a carga, a energia, a catapulta do cometedor de crimes de ódio. Grande Mandela estava certíssimo: ninguém nasce odiando ninguém.

Por isso, do alto de toda minha indignação, de todo meu horror e lamento, pergunto mais uma vez, porque acho que devo, porque acho necessário, porque é urgente: o que estamos fazendo, que atitudes estamos tomando, diariamente, para tentar reverter essas situações?






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